Wednesday, January 31, 2007


O último poema


Assim eu quereria o meu último poema.
Que fosse terno dizendo as coisas mais simples e menos intencionais
Que fosse ardente como um soluço sem lágrimas
Que tivesse a beleza das flores quase sem perfume
A pureza da chama em que se consomem os diamantes mais límpidos
A paixão dos suicidas que se matam sem explicação.
(Manuel Bandeira)

Saturday, January 27, 2007

Nem toda arte é uma tela

Nem toda arte é uma tela.
Nem toda tela é branca.
Tudo que te dedico é arte.
Tardes noites de lençóis lívidos,
Nem sequer vividos.


Zé Eduardo
Brasília 27/01/2007

Friday, January 26, 2007

Imaginemos

Imaginemos que tua sede está longe de saciar.
Que eu me tornei uma água desejada, ainda que agora indigesta.
Mas que continuarei correndo, como cachoeiras, quedas d’água, meras gotas, colírio a semprer querer banhar teus olhos.
E continuarei brotando no fluxo espesso do gozo,
Te banhando toda de branco.
Imaginemos que tua pele possa receber meu toque e meu despejar de amor sobre ti.
Ou fingimos que nada imaginamos nestes lençóis sedentos de amor.

Zé Eduardo
Brasília 26/01/2007

O agora não é mais tempo

O agora não é mais tempo.
O tempo quedou suspenso em tuas coxas, teu hálito, esguio dorso.
Ficou emaranhado no agridoce do teu sexo,
Nós intricados demais a desatar.
O tempo, produtor de ruína e vida,
Instalou-se em teus cabelos grossos, insubordinados,
Fixou-se no maravilhamento de tuas ancas,
Teu andar nua pelo quarto imerso em nossos cheiros.
(E como era encantador teu caminhar alto e soberbo.)
O tempo do amor, não o tempo do cotidiano,
O tempo eterno que compõem tuas curvas,
O tempo de um segundo tornado horas e dias e existir
De um beijo roubado na janela.
O tempo da perda, o tempo que não se aceita,
Relógio de areia a marcar a duração de um jogo interrompido por misteriosa intempérie.
Raios de céu turvo, luz que assombra nuvens,
Deuses tantos que resolveste esquecer,
Insetos pequenos que se jogam ao suicídio em um copo cheio de nada.

Zé Eduardo
Brasília
26/01/2007

Tuesday, January 23, 2007

Ser poeta é uma merda

Ser poeta é uma merda,
só faz a gente sofrer.
As musas vão e vêm
Como se a gente fosse a porta giratória
De um hotel onde eventualmente se pernoita,
E deixam em vermelho incadescente seus registros na portaria.
Se enredam na insubstância de nossas palavras
E nós viramos léxico arrumadinho, estrambótico, romântico,
Para o deleite dos álbuns de recordações.
Deitados quietos nos escuros
Enquanto elas, amadas, vestidas dos pitéus finos de apaixonados adjetivos,
Despem-se em leitos alhures,
Sangrando as carnes e quebrando os ossos de que elas não supõem
Que somos também feitos.
Ser poeta é uma merda,
Preferiria a calma indiferença de uma concha, um toco, um taco de assoalho.
Mas não adianta.
Ser poeta é uma merda.

Zé Eduardo
Brasília
23/01/2007

A teia do tempo

A teia do tempo

Tece, tecedeira, estes fios que um dia a vida há de cortar.
Fia em seu tear as tramas que um dia jazerão esquecidas num sagrado e oculto sótão.
Escolhe com rigor as cores: violeta, para os mortos; amarelo, para aqueles que esperam,
Vermelho para o baile, a morte – o cinza, para depois de tudo.
Tece o chale que a envolverá na noite,
Aquietando cabelos em desespero.
Tire de seu corpo estes tantos panos úmidos de desconforto,
Descubra-se para a lua que tarda.
Cubra teus peitos dos sangüíneos tecidos da paixão
Mas não deixe que a vejam assim, bifurcada.
Ore por seu ofício, a vida.

Zé Eduardo
Brasília
19/1/2007

Desterro

Quando seu rosto não mais trafegar em meus sonhos,
Aparição da mais doce fantasia,
Quando suas pernas se desentrelaçarem de minhas memórias,
A libertar as imagens dos dias e das noites que amamos juntos,
Quando seus densos olhos deste denso verde não mais iluminarem madrugadas
E se fecharem para mim como se fecham comportas, represando o desejo que jorra, água pura,
Quando tua boca perder o tom do meu encanto,
A me embalar e estremecer em sua musica,
Quando os ventos baterem as pesadas portas abertas do meu querer,
E eu me encontrar vazio, só, nu diante da descoberta,
Quando seus pés não mais sugerirem carinhos,
Toque das minhas mãos em tua úmida intimidade,
Quando a chuva enfim lavar tudo que escrevi na areia do tempo,
As palavras solenes, incorruptíveis,
Aí terei te esquecido.
Ai terei depositado a espada que retirei da pedra como eleito
Num forçado retiro da batalha cujas todas frentes não conheci jamais.
Você aparecerá com seus cabelos banhados nos rios
A beleza deslizando a cada gota que escorre de seu corpo,
Surgirá como desconhecida a um coração desbotado pelo tempo,
Mergulhará de novo das profundezas de onde veio
E afogará minha dor, meus mitos, meu amoroso destempero, minha graça,
Apagará a luz que apagada se encontrava pelo olvido,
Desligará a energia que me ligava a você
E fazia desfilar as suas magias, uma a uma,
Sucessão de retratos de um álbum guardado na gaveta.

...

Por enquanto, quieto em meu desterro,
Te amo.

Zé Eduardo

Brasília, 18/1/2007

Comuns

Você é uma mulher comum, eu sou um homem comum.
Somos.
Agora há pouco vi um rinoceronte nas nuvens,
prestes a se dissolver.
O vento dispersa tudo.

Zé Eduardo
20/0/2007
Brasilia

Monday, January 08, 2007

Smile

(Charlie Chaplin)

Smile though your heart is aching
Smile even though it's breaking
When there are clouds in the sky, you'll get by
If you smile through your fear and sorrow
Smile and maybe tomorrow
You'll see the sun come shining through for you

And light up your face with gladness
Hide every trace of sadness
Although a tear may be ever so near
That's the time you must keep on trying
Smile, what's the use of crying?
You'll find that life is still worthwhile
If you just smile

Saturday, January 06, 2007

Friday, January 05, 2007

A Felicidade

Quem abraça uma mulher é Adão. A mulher é Eva
Tudo acontece pela primeira vez.
Avistei uma coisa branca no céu. Dizem-me que é a lua, mas o que posso fazer com uma palavra e uma mitologia...
As árvores dão-me um pouco de medo. São tão formosas.
Os mansos animais se aproximam para que eu lhes diga seu nome.
Os livros da biblioteca não tem letras. Quando os abro, surgem.
Ao folhear o atlas projeto a forma de Sumatra.
Quem acende um fósforo no escuro está inventando o fogo.
No espelho há outro à espreita.
Quem olha o mar vê a Inglaterra.
Quem profere um verso de Liliencron já entrou na batalha.
Sonhei Cartago e as legiões que desolaram Cartago.
Sonhei a espada e a balança.
Louvado seja o amor em que não há possuidor nem possuída, mas dois que se entregam.
Quem desce a um rio desce ao Ganges.
Quem olha um relógio de areia vê a dissolução de um império.
Quem joga com um punhal pressagia a morte de César.
Quem dorme é todos os homens.
No deserto vi a jovem Esfinge, que acabam de lavrar.
Não há nada tão antigo sob o sol.
Tudo acontece pela primeira vez, porém de modo eterno.
Quem lê minhas palavras está inventando-as.

(Jorge Luis Borges)

Thursday, January 04, 2007

Yesterdays

Siga


(Fernando Lobo/Hélio Guimarães)

Siga
Vá seguindo
O seu caminho

Escolha o rumo
Que quiser
Quem sabe do mundo
Sou eu
Vagabundo
Das estradas e do tempo
Eu sei

Passa
O tempo passa
A vida passa
Eu já não sei mais
O que é que eu sou
Quam sabia do mundo
Era eu
Vagabundo
Das estradas e do tempo
Cansei