Tuesday, February 27, 2007
A Despedida
Não parecia tão certo e bom nos separarmos?
Então porque, mais que um crime, isso assombrou-nos?
Desconhecemo-nos, pois dentro
de nós um deus reina supremo.
Como trair a quem primeiro nos deu vida
e atribuiu sentido a nós, deus tutelar
que suscitou o nosso amor?
Traí-lo é algo que eu não posso.
O mundo tem, contudo, em mente um outro equívoco,
exerce outro afazer de bronze, as suas leis
são outras e o costume, dia
a dia, nos subtrai a alma.
Que seja: eu o sabia. Desde quando o medo.
que se arraigou disforme, opôs mortais e deuses,
devem morrer, para aplacá-lo,
com sangue, os corações dos que amam.
(Friederich Hölderlin 1770/1843)
Poema
Tua voz ainda está descendo por estes rios.
Em todas as árvores
só se conta a tua história.
As sombras imitam formas do teu vulto,
os reflexos do sol te repetem.
Há tanto de ti
as coisas que olhaste
que se te quero encontrar
encosto o ouvido no seio da noite,
mergulho nas águas,
rolo na terra
e te sinto folhagem,
te respiro no vento.
Tudo o que em tua pele tocou,
colo de colina
chuva que te molhou,
relva em que dormiste,
pedras, estrelas, lagoas,
tudo com teu olhar me olha agora.
Teu rosto enche a paisagem circular
e voltando para cima
beija no espaço
a rosa dos dias.
Depois que anoitece,
lá fora a montanha
ainda é teu corpo branco
que se despe.
(Anibal Machado)
Em Suma
Friday, February 23, 2007
As feridas
Não coço publicamente as feridas
Ou deixo que virem chagas,
Ainda que meu coraçao se escame,
Ferida exangüe.
Não canto samba-canção,
(E de fabrica nenhuma saístes
A merecer apitos, quiçá fossem três.)
Meu coração não vacila como se a leitura
Fosse o eterno ondular das imprecisas impressões
Dos eletrocardiogramas.
Nem minhas chagas torno invisíveis
No escuro de tantas desatinadas noites,
Nas quais me ponho qual latrina a aceitar dejetos.
Não fujo do gozo como o diabo da cruz
Que nem sequer comecei a aprender a carregar,
Ou cultuo a igreja que me impôs tal pecado.
Não aceito o que me afirmam tão torto.
Não sambo em tua quadra as canções que mal conheces,
Das quais apenas balbucias estribilhos
Chacoalhando languidamente
Qual cabide de armário
Trancado sempre num caminhão de mudança.
Brasília, 23/2/2007
Ou deixo que virem chagas,
Ainda que meu coraçao se escame,
Ferida exangüe.
Não canto samba-canção,
(E de fabrica nenhuma saístes
A merecer apitos, quiçá fossem três.)
Meu coração não vacila como se a leitura
Fosse o eterno ondular das imprecisas impressões
Dos eletrocardiogramas.
Nem minhas chagas torno invisíveis
No escuro de tantas desatinadas noites,
Nas quais me ponho qual latrina a aceitar dejetos.
Não fujo do gozo como o diabo da cruz
Que nem sequer comecei a aprender a carregar,
Ou cultuo a igreja que me impôs tal pecado.
Não aceito o que me afirmam tão torto.
Não sambo em tua quadra as canções que mal conheces,
Das quais apenas balbucias estribilhos
Chacoalhando languidamente
Qual cabide de armário
Trancado sempre num caminhão de mudança.
Brasília, 23/2/2007
Toda flor
Toda flor é uma flor que se cheire
Ainda que só pelo atavismo.
Nos inclinamos e aspiramos o que dela vem,
ainda que não cheire a nada.
As formas tomam o lugar dos sentidos,
e elas, centradas em sua beleza,
se regozijam em sua ingenuidade.
Pétalas viçosas com medo da queda
que nada mais é que o destino,
temem perder sua seiva,
que não perderão por não perderem a essência,
tanto a do perfume, quanto do que está para lá
de seus visíveis encantos.
Uma flor apenas renasce de si mesma,
do humus, da seiva, do que a faz brotar.
Seria como, depois de atribuir espinhos aos cactos,
tratar de fazer com que nos espetem impiedosamente
quando sua função é de apenas serem espinhos,
e não de causar dor,
ou precisar que pacientemente
os arranquemos de nossas carnes.
Há flores de toda espécie,
bem ao lado de um muro de cemitério,
contrastando suas cores com a rigidez dos ciprestes,
de noite, hieráticos contra o céu,
guardiães últimos do que dura
sem nem mais ter consciência de durar.
Dos ninhos nos ciprestes as andorinhas voam e,
Ao chegar a noite, dormem ao ponto
de jamais sabermos que existiram.
Interessante teia, a noite,
que envolve com sua sombra os desejos.
Ela os enreda e com sua geometria precisa
os transforma em ritmos que batem em corações
que não mais podem dormir tranquilos.
Quanta imprecisão nos hábitos, nos gestos adquiridos,
nos apelos mal guardados e necessitando expressão
sem olhos para a dor à volta.
…………….
Têm umbigos, as flores,
tem pernas, estames, pistilos,
a química da reprodução
que agora nada reproduz a não ser seus clichês.
Temem, as flores, que seu despetalar não venha mais com a manhã,
e sim com um amanhã que não podem jamais ajudar a fabricar.
Ainda que só pelo atavismo.
Nos inclinamos e aspiramos o que dela vem,
ainda que não cheire a nada.
As formas tomam o lugar dos sentidos,
e elas, centradas em sua beleza,
se regozijam em sua ingenuidade.
Pétalas viçosas com medo da queda
que nada mais é que o destino,
temem perder sua seiva,
que não perderão por não perderem a essência,
tanto a do perfume, quanto do que está para lá
de seus visíveis encantos.
Uma flor apenas renasce de si mesma,
do humus, da seiva, do que a faz brotar.
Seria como, depois de atribuir espinhos aos cactos,
tratar de fazer com que nos espetem impiedosamente
quando sua função é de apenas serem espinhos,
e não de causar dor,
ou precisar que pacientemente
os arranquemos de nossas carnes.
Há flores de toda espécie,
bem ao lado de um muro de cemitério,
contrastando suas cores com a rigidez dos ciprestes,
de noite, hieráticos contra o céu,
guardiães últimos do que dura
sem nem mais ter consciência de durar.
Dos ninhos nos ciprestes as andorinhas voam e,
Ao chegar a noite, dormem ao ponto
de jamais sabermos que existiram.
Interessante teia, a noite,
que envolve com sua sombra os desejos.
Ela os enreda e com sua geometria precisa
os transforma em ritmos que batem em corações
que não mais podem dormir tranquilos.
Quanta imprecisão nos hábitos, nos gestos adquiridos,
nos apelos mal guardados e necessitando expressão
sem olhos para a dor à volta.
…………….
Têm umbigos, as flores,
tem pernas, estames, pistilos,
a química da reprodução
que agora nada reproduz a não ser seus clichês.
Temem, as flores, que seu despetalar não venha mais com a manhã,
e sim com um amanhã que não podem jamais ajudar a fabricar.
Thursday, February 22, 2007
Eros e Psique
Tuesday, February 20, 2007
No meu jardim
No jardim da minha imaginação
Tem cravos, primaveras, buganvíleas,
margaridas, girassóis, damas-da noite,
violetas, anêmonas, avencas, azaléias,
magnólias, lírios, narcisos, tulipas, primaveras.
No meu jardim tem antúrios, alcachofras, mimosas,
alpínias, gardênias, gérberas, bromélias,
cactus, camélias, e mato, muito mato.
No meu jardim tem bichos espantosos, abelhas,
tem chuva e depois da chuva,
tem sol e tem lua e noite,
ciclames, frésias e lírios,
prímulas e helicônias,
amores-perfeitos (e imperfeitos), violetas.
Tem grama e chão onde deitar
para ouvir o coração da terra
que molha nossos corpos no orvalho.
Do meu jardim a relva às vezes sai desordenada,
vitalidade que pula das sementes e se espalha para o céu.
E tem besouros, vagalumes, louva-deus, taturanas,
beija-flores, sabiás na comunhão
de tudo que cultua a luz.
No meu jardim a sombra é apenas o descanso
e o alívio quando o calor queima.
No meu jardim agora é outono
e a claridade bate de banda
como de banda a gente anda quando anda em solidão.
No meu jardim tem minúsculas casinhas
onde habitam deuses invisíveis,
imagens que conduzem nossas vidas.
No meu jardim as coisas fenescem e morrem e retornam,
eternamente.
No meu jardim tem espinhos e a aridez da argila,
massinha de moldar em busca de seu molde.
No meu jardim há olhos que não dormem e brilham no escuro,
fantasmas e ninfas que moram nas fontes.
No meu jardim a água corre e a seiva jorra dos troncos
e minhocas hibernam até revolver a massa escura, aconchegante e quente e úmida que vai dar na superfície,
onde as esperam o risco da morte retorcida na secura ou o alimento.
Não tem artifícios, o meu jardim.
Nele simplesmente tudo está ou não está,
porque nele o olhar revela tudo.
Mas tem uma coisa que falta em meu jardim.
No jardim da minha vida
eu quero é molhar a sua rosinha.
(zé eduardo)
Tem cravos, primaveras, buganvíleas,
margaridas, girassóis, damas-da noite,
violetas, anêmonas, avencas, azaléias,
magnólias, lírios, narcisos, tulipas, primaveras.
No meu jardim tem antúrios, alcachofras, mimosas,
alpínias, gardênias, gérberas, bromélias,
cactus, camélias, e mato, muito mato.
No meu jardim tem bichos espantosos, abelhas,
tem chuva e depois da chuva,
tem sol e tem lua e noite,
ciclames, frésias e lírios,
prímulas e helicônias,
amores-perfeitos (e imperfeitos), violetas.
Tem grama e chão onde deitar
para ouvir o coração da terra
que molha nossos corpos no orvalho.
Do meu jardim a relva às vezes sai desordenada,
vitalidade que pula das sementes e se espalha para o céu.
E tem besouros, vagalumes, louva-deus, taturanas,
beija-flores, sabiás na comunhão
de tudo que cultua a luz.
No meu jardim a sombra é apenas o descanso
e o alívio quando o calor queima.
No meu jardim agora é outono
e a claridade bate de banda
como de banda a gente anda quando anda em solidão.
No meu jardim tem minúsculas casinhas
onde habitam deuses invisíveis,
imagens que conduzem nossas vidas.
No meu jardim as coisas fenescem e morrem e retornam,
eternamente.
No meu jardim tem espinhos e a aridez da argila,
massinha de moldar em busca de seu molde.
No meu jardim há olhos que não dormem e brilham no escuro,
fantasmas e ninfas que moram nas fontes.
No meu jardim a água corre e a seiva jorra dos troncos
e minhocas hibernam até revolver a massa escura, aconchegante e quente e úmida que vai dar na superfície,
onde as esperam o risco da morte retorcida na secura ou o alimento.
Não tem artifícios, o meu jardim.
Nele simplesmente tudo está ou não está,
porque nele o olhar revela tudo.
Mas tem uma coisa que falta em meu jardim.
No jardim da minha vida
eu quero é molhar a sua rosinha.
(zé eduardo)
Wednesday, February 14, 2007
Eros e Psique
O coração trapaceia, ilude, engana,
Fantasmagoriza seu dono.
Mas a alma não.
O coração arma, negaceia, foge tão rápido de tudo
Que não lhe parece confortavel.
Mas a alma não.
Ama, a alma? Quer, a alma, deseja, goza a alma?
A alma sim.
Brasília 14/2/2007
Fantasmagoriza seu dono.
Mas a alma não.
O coração arma, negaceia, foge tão rápido de tudo
Que não lhe parece confortavel.
Mas a alma não.
Ama, a alma? Quer, a alma, deseja, goza a alma?
A alma sim.
Brasília 14/2/2007
Sunday, February 11, 2007
Imitação da Alegria
Ali onde as árvores fazem
a tarde ainda mais abandonada
indolente
sumiu teu último passo,
como a flor que mal se mostra
sobre a tília e insiste em viver.
Buscas sentidos para teus afetos,
encontras o silêncio em tua vida.
Outro destino me revela
o tempo refletido. Pesa-me
como a morte, a beleza que agora
noutras faces brilha.
Perdida está toda coisa inocente,
mesmo nesta voz, sobrevivente
a imitar a alegria.
(Salvatore Quasimodo)
a tarde ainda mais abandonada
indolente
sumiu teu último passo,
como a flor que mal se mostra
sobre a tília e insiste em viver.
Buscas sentidos para teus afetos,
encontras o silêncio em tua vida.
Outro destino me revela
o tempo refletido. Pesa-me
como a morte, a beleza que agora
noutras faces brilha.
Perdida está toda coisa inocente,
mesmo nesta voz, sobrevivente
a imitar a alegria.
(Salvatore Quasimodo)
Subscribe to:
Posts (Atom)